quinta-feira, 26 de abril de 2012

As sementes de 2Co 9 são ofertas para a igreja?

No AT, a recompensa pela fidelidade no dízimo estava vinculada à prosperidade material. Atualmente a recompensa pela fidelidade na mordomia cristã se relaciona a bênçãos espirituais (MACDONALD, 2011, p.797). 

Propaga-se, hoje com mais  intensidade, a teologia de que "dinheiro atrai dinheiro", isto é, a oferta de dinheiro a Deus (entenda para a conta-corrente de algum ministério) atrai o favor divino trazendo-lhe mais dinheiro. É ensinado, portanto, que devemos plantar dinheiro para colher mais dinheiro. As ofertas não são mais movidas pelo amor ao próximo, e sim pelo amor a si mesmo, pelo egoísmo e pela ganância financeira. É a chamada "lei da semeadura".
O capítulo 9 da 2ª carta aos Coríntios é o texto do Novo Testamento predileto para leitura antes do momento de se recolher ofertas financeiras, no intuito de sensibilizar os ouvintes e garantir uma “boa colheita” de "sementes" para os cofres da congregação ou de algum ministério qualquer.
É preciso deixar claro, desde o início, que Paulo não está pedindo ofertas para cobrir despesas do seu ministério, que era intenso e dispendioso, por sinal. Ele estava discutindo com os coríntios a questão da coleta que estava sendo feita entre as igrejas gentílicas para ajudar os pobres judeus cristãos da Judeia que foram duramente atingidos pela fome durante o reinado do imperador Cláudio, no período de 41-54 d.C. e a igreja de gentílica de Antioquia (Síria) tinha reagido rapidamente mediante o envio de dinheiro por Barnabé e Paulo, conforme registro em At 11.27-30 (CARSON, 2009, p.1802).
Paulo usa o exemplo dos macedônios que, apesar de estarem enfrentando tribulação e profunda pobreza expressaram a sua generosidade, contribuíram até mesmo acima de suas posses para ajudar os cristão ainda mais necessitados que eles (2Co 8.3-5).
E digo isto: Que o que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância ceifará (2Co 9.6).
Repartir com outros é semelhante a espalhar sementes: quanto mais semearmos, mais ceifaremos. Isso não é uma promessa que se alguém der 7 reais irá receber 77 reais de volta. Em vez disso, é uma afirmação da habilidade de Deus de dar mais que seu povo (RICHARDS, 2004, p.1029).
A convicção de que Deus é capaz de suprir nossas necessidades tem como objetivo nos libertar para dar generosamente, sem receio de virmos nos privar, ou a nossa família, quando formos ao encontro das necessidades dos outros (RICHARDS, 2004, p.1030).
No texto específico, Paulo recomenda a assistência caridosa usando uma bela comparação em que vincula-a à semeadura. Pois na semeadura, a semente é enterrada no solo, de modo que aparentemente veio a se perder. Dá-se o mesmo com os donativos: o que sai de nós para alguém parece diminuir o que possuímos, mas o tempo da colheita virá, os frutos aparecerão e serão colhidos. O Senhor considera o que é doado aos pobres como sendo doado a Ele mesmo, e um dia, agora ou no porvir, recompensará o doador:
Ao SENHOR empresta o que se compadece do pobre, ele lhe pagará o seu benefício (Pv 19.17).
A semente e a ceifa não se referem necessariamente a finanças. A colheita não se refere necessariamente ao alcance de vitórias na área da saúde, da habitação, do judiciário ou mesmo de conversões de entes queridos, que Deus pode até conceder, mas não são o alvo da vida cristã.
Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens (1Co 15.19).
Não se trata de receber de volta exatamente o que foi dado, mas de receber uma porção muito maior. É claro que esse retorno se refere mais a bênçãos espirituais do que a bens materiais (MACDONALD, 2011, p.567).

Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, ou por necessidade; porque Deus ama ao que dá com alegria (2Co 9.7).
O receio de perdermos algo não pode nos impedir de fazer o bem, lembrando que Deus julga a liberalidade com base na disposição e não na quantidade dada.
É possível contribuir com um coração pesaroso. Também é possível contribuir sob a pressão de apelos emocionais ou sob constrangimento público. Nenhuma dessas motivações é válida, porque Deus ama a quem dá com alegria. O que importa para Ele é a atitude do coração. Deus tem prazer em ver o cristão repleto de alegria do Senhor que deseja compartilhar seus bens com os outros (MACDONALD, 2011, p.567-8).

E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda a boa obra (2Co 9.8).
Encontramos aqui a promessa de que, se uma pessoa deseja ser, de fato, generosa, Deus lhe dará a oportunidade de exercer sua generosidade. Paulo menciona um duplo benefício: que teriam o que bastasse para si e um excedente para a prática do bem compartilhando com os mais carentes. Em relação a esse versículo o reformador João Calvino esclarece em seu comentário sobre essa epístola:
Pelo termo suficiência, ele tem em mente aquela medida que o Senhor bem sabe ser-nos proveitosa, pois nem sempre é-nos proveitoso acumular à saciedade (…). Porque a razão de Deus nos fazer o bem não é tanto para que alguém guarde para si mesmo o que recebeu, mas para que haja mútua participação entre nós, de acordo com os reclamos das necessidades (CALVINO, 2008, p. 234).

Conforme está escrito: Espalhou, deu aos pobres; A sua justiça permanece para sempre (2Co 9.9).
Neste versículo o apóstolo cita o Salmo 112.9.
O versículo descreve um homem que semeou com fartura, isto é, realizou atos de bondade, suprindo as necessidades dos pobres. Ele saiu perdendo com isso? De maneira nenhuma! Sua justiça permanece para sempre. Isso significa que, se espalharmos nossa bondade como um semeador espalha as sementes, ajuntaremos tesouros no céu. O resultado de nossa bondade permanecerá para sempre (MACDONALD, 2011, p.568).

Ora, aquele que dá a semente ao que semeia, também vos dê pão para comer, e multiplique a vossa sementeira, e aumente os frutos da vossa justiça (2Co 9.10).
Paulo faz menção aos resultados das bênçãos divinas: primeiro, termos o suficiente para o sustento da vida; em seguida, termos algo que doar com o fim de aliviar as necessidades de outras pessoas.
Ao falar de semente, ele faz referência aos meios pelos quais se faz o bem; e por fruto, ele quer dizer a própria obra de assistência que é  prestada; porque justiça, aqui é usada por sinédoque, para significar a beneficência (CALVINO, 2008, p. 236).
Dar assistência às necessidades de nosso semelhante é uma parte da justiça – e não é de modo algum, a menor parte -, os que negligenciam esta parte de seu dever devem ser tidos na conta dos injustos (CALVINO, 2008, p. 237).
Ao levantar uma oferta para os cristãos em Jerusalém, os coríntios estavam praticando um ato de justiça em decorrência do qual colheriam recompensas eternas (grifo nosso). À medida que Deus lhe concedesse mais capacidade de contribuir e eles o fizessem com mais generosidade, suas recompensas também seria maiores (MACDONALD, 2011, p.568).

Para que em tudo enriqueçais para toda a beneficência, a qual faz que por nós se deem graças a Deus (2Co9.11).
Paulo nos ensina que estas são as verdadeiras riquezas dos crentes – quando confiam que a providência divina lhes dará sustento suficiente, e não desanimam em fazer o bem por desconfiança. Ninguém é mais frustrado ou carente do que aquele que vive sem fé, cuja preocupação com suas posses dilui toda a sua paz.

Porque a administração deste serviço, não só supre as necessidades dos santos, mas também é abundante em muitas graças, que se dão a Deus (2Co9.12).
Paulo descreve os resultados da contribuição antecipada dos coríntios não somente como suprindo a necessidade dos santos, mas que também redunda em muitas graças a Deus.
Os que se beneficiarem glorificarão a Deus pela obediência da confissão dos coríntios e pela liberalidade com que contribuíram para eles e para todos, e em seus corações oram eles a favor dos coríntios com grande afeto (CARSON, 2009, p.1805).

Portanto, o capítulo não trata de dízimo ou de ofertas para a “manutenção da obra”, e sim de contribuições exclusivas para ajudar os cristãos mais necessitados que se encontravam na judeia, enfrentando privações materiais.
Atitudes como esta estão cada vez mais escassas no meio evangélico. Os ministérios esquecem-se, ou não dão a importância devida á missão integral da igreja, que deve olhar o ser humano, não apenas como uma alma necessitada de salvação, mas também como corpo e suas carências neste mundo. A expressão do amor a Deus é manifestada através de ações que manifestam o amor ao próximo:
Se alguém diz: Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu? E dele temos este mandamento: que quem ama a Deus, ame também a seu irmão (1Jo 4.20,21).

Saber pensar, saber crer!

por: Joel Alexandre

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